quarta-feira, 19 de setembro de 2012

Phosphenes (i)

Parte i
(I know that it is freezing, but I think we have to walk
Eu sei que está congelando, mas eu acho que nós temos que andar)
Lua - Bright Eyes
*Phosphenes (fosfenos): um exemplo de fosfeno são os padrões luminosos que aparecem quando a pálpebra é esfregada com bastante pressão.


Ela aparece sem aviso, depois de quatro anos de ausência, na tua porta, vestindo uma confusão de cores e texturas (cabelo laranja, meia calça amarela, casaco roxo), machucando teus olhos acostumados aos tons monocromáticos da tua vida.
– ‘Tá nevando. – ela diz rindo animadamente, porque faz muito tempo que ela não vê neve e você sabe disso. Você pode não ter entrado em contato com ela, mas sabia muito bem onde e com quem ela estava. – Larga tudo o que estiver fazendo e vamos sair. Quero fazer um boneco de neve.
Alguma coisa, talvez o tal do bom senso, pede que você feche a porta na cara dela e finja que nada aconteceu. Mas...
– Você não é um pouco, digamos, velha demais pra isso? – você questiona, enquanto calça um par de sapatos e veste um casaco.
É a primeira neve do ano, e o vento gélido parece congelar os teus sentidos, mas a mão dela está na sua, pequena e quente, e ouvir o som da risada dela depois de tanto tempo faz você sorrir genuinamente. Então vocês passam a tarde toda andando pela cidade, batendo papo, descobrindo o que tem acontecido na vida um do outro. Ela te conta que não quer mais ser modelo. Você fala que não quer mais trabalhar na empresa do seu tio. E a conversa flui com facilidade, como se nunca houvesse existido tempo e distância entre vocês.
De madrugada, ela está meio adormecida ao seu lado, vestindo uma cueca samba-canção e um moletom seu como pijama, e você finalmente resolve mencionar “o elefante na sala”.
– Philippa. – você sussurra.
– Huum?
– Porque você está aqui? – não que a visita dela seja desagradável, muito pelo contrário, mas você sabe que existe um motivo específico para ela aparecer de repente em Chicago.
Ela abre os olhos e na escuridão do quarto você não consegue distinguir o azul acinzentado dos olhos dela, entretanto é fácil ler o arrependimento em sua expressão.
– Eu me meti em uma encrenca, das grandes. Preciso de dinheiro. – confessa com embaraço evidente. – E você é a única pessoa que não vai me julgar pelo que eu fiz...por favor, me ajuda. – pede, a voz frágil pelo medo e pelo cansaço. É a primeira vez que ela pede sua ajuda desde do dia que ela tenta tanto esquecer.
– Tudo bem. – você responde suspirando. – Amanhã resolvemos isso, agora dorme. – você passa gentilmente a mão na testa dela e ela volta a fechar os olhos para logo em seguida te abraçar com força, com certo desespero, como se você fosse subitamente desvanecer entre os dedos dela.
Um carro passa na rua, chiando os pneus no asfalto molhado e você já está praticamente dormindo quando:
– Eu senti sua falta, Greg. – a voz dela vem num sussurro tão baixo que você não tem certeza se é sonho ou realidade.

continua...

6 comentários:

  1. Saudades <3 Você já pode começar a postar mais vezes, viu?
    Adorei o texto!

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  2. Você escreve demais, Aline *-* quero saber a continuação. Que encrenca ela se meteu pra precisar dele assim ? :3 Curiosa, eu ? Magina.

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  3. Adorei, Aline! Quero muito ler a continuação! <3

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  4. Muito bom...quando vais postar a continuação?

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  5. Acho o texto belíssimo, de verdade, mas gosto dele assim, suspenso. Prefiro não saber o que houve, prefiro ficar só com a informação de que ela se meteu em algo complicado e que correu pro Greg. Não por ele ser o único a não julgar, mas pela frase final:
    "– Eu senti sua falta, Greg. – a voz dela vem num sussurro tão baixo que você não tem certeza se é sonho ou realidade.".

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